quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Quando a velhice chegar



Quando a velhice chegar a ti, e tu sentir as dores típicas que assolam a idade, te olharás no espelho, os poucos cabelos que ainda te restaram serão brancos como a neve, e a imagem refletida nada lembrará o que um dia na mocidade tu fostes, mas mesmo assim terás vivido uma vida plena e feliz. Cercado certamente das pessoas que dedicaram uma vida a te amar. Certamente não andarás com aquela pressa que sempre te acompanhou, seus passos agora serão curtos e usarás uma bengala como auxílio. E em um belo fim de tarde primaveril seguirá com a ajuda de tua neta, já crescida até a enorme varanda que circunda tua casa, teu pedido será o de sempre:
- Quero que leias minha neta enquanto assisto a mais um belo pôr do sol.
Te sentarás em uma cadeira de balanço com dificuldade, teus olhos vão correr pela tua bela propriedade, a qual com muito trabalho e disciplina conquistasse, e te sentirás realizado. A brisa trará o doce perfume das rosas do teu jardim, como agradecimento pelo tempo que dedicas a cuidar delas logo no raiar do dia, será um do teu passatempo favorito. E enquanto ouves as doces e melancólicas palavras que ela lê para ti, te lembrarás com doçura das tuas travessuras, quando jovem em torno de teus trinta e poucos anos.
Das noites de verão que passaste na companhia de uma bela jovem, que há muito te atormentava os sonhos.
Cara de anjo, só que em teus braços, te despertavam as tentações que só demônios podiam provocar. E neste momento ainda correrá por sobre tua pele um arrepio que te fará estremecer e perder o ar.
Tua neta vai perceber, e perguntar se estará tudo bem contigo, e tu vai pigarrear buscando a voz pra dizer a ela:
- Saudades da minha mocidade, apenas isso, mas continue a ler, gosto especialmente desses poemas que vens lendo nas últimas semanas. Trazem-me boas lembranças.
Ela vai sorrir, e logo retomará a leitura, e tu, retornarás ao passado por que apesar da idade avançada, tua mente não te trairá. Por mais que desejares essas lembranças iram te assolar até que teu coração dê seu último sopro de vida. Ainda assim antes de partir para a eternidade essas lembranças vão passar diante de teu olhos, como se tu fosse um expectador de um filme.
Recordarás com saudade, de uma pequena que com relutância tentou te evitar ao máximo, mas que tu com a tua teimosia, continuava a cortejá-la, e não ia desistir tão fácil. Sabias que ela estava em uma profunda tristeza, e não te darias por vencido, até tê-la em seus braços e desfrutar de ao menos tocar naqueles lábios, que em tuas noites solitárias, despertavam os teus mais sombrios desejos.
Recordarás também do primeiro encontro, das boas risadas que deram juntos, mas, também do momento em que a deixaste em casa, do exato momento do primeiro beijo.
Beijo esse que lhe tirou o fôlego saciou tua fome e realizou o teu profano desejo de tocá-los, pois, não via a hora de finalmente sentir o gosto ardente desse beijo profano, enlaçasse teus dedos pelos longos e negros cabelos, sentisse o cheiro de lavanda que provinha deles, desceu tua boca faminta pelo pescoço dela num ato desesperado, como se nunca mais fosses ter a chance de sentir o cheiro daquela pele alva. Que te provocava pelo simples fato de tu saber que ainda não era tua, que te alucinava a cada noite quente e solitária.
Teu alívio era chegar tarde da noite de teu trabalho e ao passar pela casa dela, ver que estava em segurança em casa. Deixava-te mais tranquilo ainda quando tu pegavas o telefone e ligava pra ela, certificando-se que estava completamente sozinha. A ideia de que talvez arrumasse um namorado de aterrorizava.
Somente tu querias ter o direito sobre ela. Dava-te repulsa só de imaginar que qualquer outro que não valesse a pena, a beijasse, e depois a iludisse. Deixando-a na profunda tristeza de um amor perdido.
Não permitirias, mesmo que não tivesses nada a oferecer, nenhum amor a prometer, e que o medo de sofrer por amor ainda te assolasse.
Mesmo assim querias a pequena pra ti.
E conseguisse.
Depois do primeiro encontro vieram outros, caminhadas na areia da praia, mãos dadas, até que a paixão tomou conta de sua carne, e ela finalmente se entregou aos desejos.
A primeira noite de amor, e como podias esquecer?
De todas as mulheres que já havias tido, essa não se comparava a nenhuma. Tinha o olhar de anjo, a voz macia, carinhosa, intensa, de riso fácil e angelical. Mas quando tu despertavas o desejo nela revelava tentações, desejos secretos e insaciáveis dignas de uma perversidade que te levava a loucura, te tirava do mundo real e esgotava-lhe até tua última força. Por fim dormia enroscada em teu corpo, e nesse período de sono que podias olhar as feições dela, por hora podias jurar uma menina doce, traços delicados e cabelos tão macios que não te importavas de ficar afagando pelo resto da noite que ainda sobrara.
Quando te ias para teus afazeres, custava a hora passar e teu desejo era de estar entre os lençóis com ela novamente.
E passaram-se o seus dias e noites, ambos felizes, com planos de conhecer lugares, um futuro, mas em nenhum momento se quer haver declarações de amor, ou promessas. Viviam apenas dia após dia e intensamente felizes na presença um do outro.
Até que o destino cruel e implacável a levou para longe de ti, e os primeiros dias te atormentaram, sentias a presença dela, o cheiro dela, e não havia um dia se quer que tu não passasses em frente a casa dela e na vã esperança esperavas ver um sinal de que ela havia regressado.
Não te sentia importantemente suficiente para exigir o regresso dela, mesmo por que julgavas não ser capaz de fazê-la feliz.
E assim se passaram dias, semanas e anos, a saudade e o desespero deram espaço para as doces recordações que ela havia deixado, daquele doce verão da tua mocidade.
A oportunidade de que tiveste o verdadeiro amor em tuas mãos, e deixastes partir, por medo e orgulho de quem sabe se prender.
Mas a vida tivera sido bondosa e lhe apresentou uma nova chance a qual te agarrasse, e hoje senhor de tuas terras e de uma família, sentes que talvez tudo pudesse ter sido diferente talvez, afinal a tua pequena tinha uma alegria infinita, estava sempre perdida em teus braços com largo sorriso e plena de felicidade e isso o deixava no paraíso.
Não cansavas de dizer a ela para que nunca deixasse de ser assim, pois isso era o que o mais encantava e as vezes achavas ser desmerecedor de tanto carinho que ela a ti dispensava.
Mas agora era tarde, e um pensamento te acertou em cheio e fez teu coração acelerar, será que tua menina ainda estava viva? E se estivesse, estaria ela como tu? Rodeado por filhos, netos e esposo?
Nunca mais chegaram notícias dela a ti, e de alguma forma isso o deixava triste.
Perdido em pensamentos, ouvirás  de longe a voz da tua neta a te chamar
- Sim, estou a lhe ouvir
- Quero ler um último poema, é da minha escritora favorita
- Claro minha pequena leia vou ouvir
Ao final ela vai te olhar novamente e por alguma razão teus olhos estarão marejados, e com a voz embargada irás perguntar a ela o nome da escritora, e ao ouvir meu nome, saberás que dediquei toda a uma vida a te amar em segredo e em virtude disso, publiquei as muitas cartas de amor, para que de alguma forma você chegasse a ter o conhecimento do sentimento mais belo e puro que um dia vivemos juntos, e as lágrimas correram pela tua face.

Assim rogo a ti essa 
'"praga"

( Escrito por Iza Marloch)